STF considera prática de vaquejada inconstitucional

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente nesta quinta-feira (06/10/2016) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4983, ajuizada pelo procurador-geral da República contra a Lei 15.299/2013, do Estado do Ceará, que regulamenta a vaquejada como prática desportiva e cultural no estado.
Por 6 votos a 5, os ministros consideraram que a atividade impõe sofrimento aos animais e, portanto, fere princípios constitucionais de preservação do meio ambiente, conforme já fora anteriormente decido pelo STF em outras "práticas esportivas".
O governo do Ceará, por sua vez, alegava que a vaquejada faz parte da cultura regional e que se trata de uma atividade econômica importante e movimenta cerca de R$ 14 milhões por ano. 
Quem estudou comigo na pós-graduação da OAB/PE sabe o quanto nós debatemos a respeito desse julgamento, eis que ele representa a aplicação prática da Teoria dos Precedentes Judiciais Obrigatórios importada para o Brasil por meio do artigo 927 do novo Código de Processo Civil.
O julgamento da vaquejada teve início em agosto de 2015, quando o relator, ao votar pela procedência da ação, portanto, pela inconstitucionalidade dessa prática, afirmou que o dever de proteção ao meio ambiente (artigo 225 da Constituição Federal) sobrepõe-se aos valores culturais da atividade desportiva.

Ora, conforme debatido com todos os meus alunos na disciplina de Teoria da Decisão Judicial, a parcela do pronunciamento judicial que gera um precedente a ser aplicado em casos futuros não está contida na ementa do acórdão ou no dispositivo de uma sentença, antes sim, na "ratio decidendi", ou seja, na fundamentação, nas razões que levam o magistrado ou a corte a adotar determinada postura em relação a um tema.
Em seu voto (leia a íntegra), o ministro Marco Aurélio afirmou que laudos técnicos contidos no processo demonstram consequências nocivas à saúde dos animais: fraturas nas patas e rabo, ruptura de ligamentos e vasos sanguíneos, eventual arrancamento do rabo e comprometimento da medula óssea. Também os cavalos, de acordo com os laudos, sofrem lesões.
Para o relator, o sentido da expressão “crueldade” constante no inciso VII do parágrafo 1º do artigo 225 da Constituição Federal alcança a tortura e os maus-tratos infringidos aos bois durante a prática da vaquejada. Assim, para ele, revela-se “intolerável a conduta humana autorizada pela norma estadual atacada”.
Para compreender melhor o sentido de um precedente judicial, você pode acessar na íntegra a fundamentação utilizada pelo STF nas decisões que também optaram por decretar a inconstitucionalidade da Farra do Boi em Santa Catarina (RE 153531-8) e da Briga de Galo no Rio de Janeiro (ADI 1856). Assim você irá perceber como as razões utilizadas nesses outros dois casos foram fundamentais para se alcançar a decisão desta quinta-feira.
Sei que para uma grande parcela da população do País essa decisão representará graves prejuízos econômicos, todavia, para os estudiosos do Direito Processual Civil, temos muito o que comemorar, a final, foram preservadas a Segurança Jurídica e a Isonomia, princípios esses que a Teoria dos Precedentes Judiciais tenta preservar a todo custo! Em poucas palavras, casos idênticos devem receber a mesma solução do Judiciário e casos que tenham as mesmas razões de decidir, ainda que não exatamente iguais, devem também receber solução idêntica.
Na sessão de hoje, também votaram os ministros Ricardo Lewandowski, e a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, ambos pela procedência da ação.
Dessa forma, seguiram o relator os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin, Teori Zavascki, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
Conforme mencionei, apesar de se referir ao Ceará, a decisão servirá de referência para todo o País, sujeitando os organizadores a punição por crime ambiental de maus tratos a animais.



Nas palavras do ilustre professor Luiz Guilherme Marinoni “Só há sentido em pensar em ratio decidendi ou em precedente obrigatório quando se almeja abarcar casos similares e não os casos já julgados, uma vez que estes, como é óbvio, já estão protegidos pela autoridade da coisa julgada material. O verdadeiro valor do precedente – seja qual for ele - não está na parte dispositiva da decisão, mas na essência das razões apresentadas para justificá-la.”¹
Caso algum outro estado tenha legalizado a prática, outras ações poderão ser apresentadas ao STF para derrubar a regulamentação.
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Um viva para todos: nós e os animais!

Profa. Fernanda Resende
¹Luiz Guilherme Marinoni, Precedentes Obrigatórios, 2ª. ed, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011.


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